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Voz Feminina, A / O Progresso

A Voz Feminina foi um periódico português, do século XIX, considerado por alguns autores como o primeiro jornal que, em Portugal e possivelmente na Europa, teve como colaboradores um grupo de jornalistas quase inteiramente composto por mulheres: pelo menos nos três primeiros números, dizia-se “Exclusivamente colaborado por Senhoras”. A maior parte dos editoriais tratava dos direitos da mulher e da necessidade de a sua educação não se restringir à que lhe permitia brilhar nos salões ou ser boa dona de casa: os debates centravam-se, em sua grande maioria, na emancipação intelectual e profissional feminina. Além da emancipação intelectual feminina, outros temas eram também debatidos no periódico como, por exemplo, a religião, a defesa dos animais maltratados, ou a apreciação de livros e artigos de jornais que tratavam de assuntos relativos à mulher. Muitos são os escritores e escritoras que, para além de Francisca Wood, redatora principal, publicaram neste jornal sobre estas temáticas: Guiomar Torresão, Marianna d’Andrade, Francisco de Mattos, Abreu Marques e Guilherme Wood são só alguns exemplos.

Relativamente à literatura, o periódico publicava poesias (de autores como Marianna Angélica d’Andrade, Emília da Maia, José Cipriano da Costa Goodolphim, entre outros) e folhetins (continuados ao longo de vários números). As obras Uma alma de mulher, de Guiomar Torresão, e Maria Severn, de Francisca Wood, são exemplos de folhetins publicados no periódico que, posteriormente, foram editados em livro. A correspondência também ocupava papel central no periódico, pois A Voz Feminina publicava cartas de leitores (a apoiar, criticar e, até mesmo, a oferecer colaboração). A redatora principal, Francisca Wood, de maneira atenciosa, costumava responder às missivas dos leitores no periódico.

Ao longo de suas publicações o jornal sofreu algumas alterações e através dos cabeçalhos de apresentação podemos notar estas mudanças. Em seus primeiros três números o jornal apresentou-se da seguinte forma: A Voz Feminina / Jornal Semanal, Scientifico, Litterário e Noticioso / Exclusivamente colaborado por Senhoras. A partir do número 4 a apresentação passou a ser A Voz Feminina / Dedicado à Ilustração das Senhoras / Scientifico, Litterário e Noticioso / Redactora Principal D. Francisca Wood. Do número 14 em diante, há uma ligeira mudança, o nome da redatora passa a ser apresentado por extenso: D. Francisca d’Assis Martinz Wood. A partir do número 51, o periódico sofre uma mudança mais significativa, já que a sua apresentação passa a incluir uma frase de cunho feminista: A mulher livre ao lado do homem livre. De julho a dezembro de 1869, ocorreu uma ainda maior alteração, mudando o título para O Progresso. Esta alteração foi provocada pelas perseguições de que o jornal era alvo, praticadas pela ala mais conservadora (e maioritária) da imprensa portuguesa. Estas perseguições tinham quase todas como alvo a redatora Francisca Wood. Por esta razão, a escritora anuncia que deixará o periódico e que seu posto será ocupado exclusivamente pelo seu marido William Thorold Wood, visto que o nome dele era menos atacado que o dela. Contudo, e devido à insistência de amigos e leitores, Francisca Wood permanece na redação até à sua última publicação.

Da publicação de 4 de julho até ao fim, o jornal passa a apresentar-se da seguinte forma: O Progresso (continuação da Voz Feminina) / Jornal Semanal, Político, Litterário e Noticioso; ainda no cabeçalho, duas frases, como lema, uma em francês e outra em português: Que la Justice soit faite coute qui coute [sic] (Que a justiça seja feita custe o que custar) e A mulher livre ao lado do homem livre. Acrescentava-se de seguida o nome dos editores responsáveis: “Redactores Guilherme e Francisca Wood”. Em dezembro de 1869, é publicado o último número, que comunica aos leitores o fim do periódico. No texto de Francisca Wood é explicado ao público leitor os impedimentos intelectuais que levavam ao encerramento do jornal: a falta de simpatia da parte do povo português e a impossibilidade de travar uma discussão franca e aberta sobre os direitos das mulheres. Tais obstáculos são vistos por Francisca Wood como prejudiciais, não só para as mulheres, mas para o progresso do país.

 

Maria Luísa Taborda Santiago

 

Para saber mais:

ALONSO, Cláudia Pazos. Anticlericalismo e feminismo na imprensa oitocentista: os artigos de fundo de Francisca de Assis Martins Wood. Porto: Afrontamento. 2021.
______. Francisca Wood and Nineteenth-Century Periodical Culture: Pressing for Change. Oxford: Legenda, 2020.
BRITO, Manuela Araújo; ROBALO, Fernanda Robalo; GUIMARÃES, Carlota. Um jornal feminista no Portugal de 1868. História, n. 92, p. 48–59, 1986.
LEAL, Maria Ivone. Um século de periódicos femininos: arrolamento de periódicos entre 1807 e 1926. Cadernos Condição Feminina, Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres, Lisboa Codex, n. 35, 1992.
LOPES, Ana Costa. Imagens da mulher na imprensa feminina de oitocentos: percursos de modernidade. Lisboa: Quimera, 2005.
OUTEIRINHO, Maria de Fátima. O folhetim em Portugal no século XIX: uma nova janela no mundo das letras. Tese (Doutoramento). Universidade do Porto, Porto, 2003.

TENGARRINHA, José. História da imprensa periódica portuguesa. Lisboa: Caminho, 1989.

Publicação do verbete: maio 2024.