Capa da terceira edição da revista Verde (Cataguases, nov. 1927)
Na pequena cidade de Cataguases, no interior mineiro, o movimento modernista ganhou nova expressão com Verde, uma revista mensal de arte e cultura, conforme anunciada em seu subtítulo, alinhada aos ideais vanguardistas. Com periodicidade mensal irregular, a revista teve duas fases: a primeira delas estreou em setembro de 1927, com cinco números publicados até julho de 1928, quando lançaram número especial acompanhado de suplemento literário relativo aos meses em que não circulou; com apenas um número, a segunda fase retornou em maio de 1929, com edição especial em homenagem ao integrante do grupo Ascânio Lopes, falecido neste mesmo ano.
Conhecidos como o Grupo Verde, os responsáveis pela publicação despertaram curiosidade tanto por sua juventude, já que eram jovens estudantes recém-saídos do ensino secundário, como também por lançarem os ideais modernistas em Cataguases, cidade de proporções modestas que, à época, contabilizava cerca de 16 mil habitantes e situada a 300 km da capital Belo Horizonte. Neste mesmo período, Cataguases foi palco de mais uma manifestação moderna com Humberto Mauro, precursor do cinema brasileiro e colega do grupo.
Durante a primeira fase, a direção da revista ficou a cargo de Henrique de Resende e a redação por Antonio Martins Mendes e Rosário Fusco. No único volume da fase seguinte, assumiram a responsabilidade pela direção Henrique de Resende, Martins Mendes, Guilhermino Cesar, Francisco Inácio Peixoto e Rosário Fusco. A redação e administração da revista localizavam-se na Rua Cel. Vieira, 53, e a impressão dos números estava a cargo da tipografia A Brasileira, com exceção do n. 5, impresso nas oficinas do jornal Cataguases. Sem informações sobre tiragem na revista, entretanto, graças à correspondência, sabe-se que as edições eram de 500 exemplares. Os preços na primeira fase eram de 1$00 réis o exemplar avulso e 11$000 a assinatura anual, com aumento no quinto número, que passou a custar 1$200 e se manteve neste preço na segunda fase.
Sem grandes inovações no aspecto visual, o projeto gráfico da capa modificou-se ao longo dos números, com simplificação na quantidade de adornos e detalhes que preenchiam os espaços vazios, mantendo-se característico o título estilizado e margens na cor verde, com o sumário apresentado ao centro. No que concerne ao material iconográfico, foram publicadas ilustrações de Rosário Fusco e colaborações estrangeiras, como os desenhos e xilogravura das argentinas Maria Clemencia e Norah Borges.
Junto ao terceiro número, veicularam o “Manifesto do grupo Verde de Cataguases”, publicado em folha avulsa na cor verde e com as mesmas dimensões da revista. No texto, saldavam a vitória de Verde em romper as barreiras do ambiente provinciano pouco acolhedor às novas ideias e que, assim, ganhou terreno nas cidades “mais cultas” do Brasil. Por fim, sintetizam seu manifesto em sete pontos:
Resumindo:
1º) Trabalhamos independentemente de qualquer outro grupo literário.
2º) Temos perfeitamente focalizada a linha divisória que nos separa dos demais modernistas brasileiros e estrangeiros.
3º) Nossos processos literários são perfeitamente definidos.
4º) Somos objetivistas, embora diversíssimos, um dos outros.
5º) Não temos ligação de espécie nenhuma com o estilo e o modo literário de outras rodas.
6º) Queremos deixar bem frisado a nossa independência no sentido “escolástico”.
7º) Não damos a mínima importância à crítica dos que não nos compreendem.
E é só isso.
Ainda que possua um tom despretensioso, o manifesto procurou demarcar seu lugar de independência e autonomia no Modernismo, quando o grupo passava a receber críticas por sua suposta imaturidade e influência do grupo paulista. Os questionamentos partiram de outros intelectuais do movimento, sobretudo aqueles envolvidos na revista Festa (Rio de Janeiro, 1927-1928; 1934-1935), contenda que pode ser acompanhada nas páginas de ambos os periódicos.
Em relação ao conteúdo, é expressiva a colaboração poética na revista, numericamente superior à prosa literária. Destacam-se também os textos de crítica literária que discutiam, sobretudo, a respeito dos rumos do movimento modernista em âmbito nacional e internacional. Entre seus colaboradores, é de se destacar como Verde reuniu colaborações de diversos grupos das vanguardas brasileiras, sendo ponto de convergência das várias experiências modernistas ao redor do país, com maior mobilização dos mineiros de A Revista e dos paulistas Mário de Andrade e Antônio Alcântara Machado. Além destes, figuraram colaborações internacionais, a saber, Blaise Cendrars e nomes ligados à vanguarda latino-americana, como os uruguaios Ildefonso Pereda Valdés e Nicolás Fusco Sansone, e o argentino Marcos Fingerit. Assim, Verde compôs ampla rede de intercâmbio cultural nos cenários nacional e internacional.
O fim de Verde foi relacionado, por seus companheiros, à morte de Ascânio Lopes; no entanto, dificuldades financeiras do empreendimento e a dispersão do grupo em outras atividades prejudicaram a continuidade da revista em sua segunda fase.
Luciana Francisco
Para saber mais:
SANT’ANA, Rivânia M. T. O movimento modernista Verde, de Cataguases-MG: 1927-1929. Cataguases: Instituto Francisca Inácio Peixoto, 2008.
Sobre o periódico:
Há coleções completas da revista disponíveis on-line na Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional (HDBN), no Acervo Digital da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM-USP) e no Portal Revistas de Ideias e Cultura (RIC-Brasil).
Publicação do verbete: fev. 2025.